1.11.11

NOVEMBRO


Pão por Deus. Halloween.Todos os Santos. Início de Novembro. Fiéis Defuntos.

Assomo à porta e um rapaz gordinho pede-me: "Dá-me o pão por Deus?".

Numa variante moderna, miúdos pediram-se doçura ou travessura e lançaram feitios anódinos em apenas mais um pretexto para a festa.

Não sou daqueles que perdem a esperança, mas vejo muitas vidas em dificuldade, ou andam à deriva, ou se acantonam em becos sem saída. A humanização da sociedade está muito para além da competitividade, do capitalismo selvagem e do salve-se quem puder.  Assistimos a atletas de ilusão e de nadas e até a morte é olhada como tabu.

Pensa-se como se vive em vez de se viver como se pensa. A medida do Homem é ser cadáver e cemitério. "De Cujus", como se diz em terminologia jurídica. Uma sociedade sem eternidade ignora a morte e desumaniza-se.

Novembro entra em todas as casas como um caminho de fim de tarde, onde há silêncios gritantes, porquês sem resposta, flores com sentido e lágrimas que exprimem amor. Se o homem é pó e amor, então não volta ao pó. Não podemos dizer que na morte não há nada. É um mistério e lá pode estar o maior tesouro. A morte faz parte da vida e só acontece quando deixamos de amar. É dentro do coração que a vida se transcende e não no engano de um beijo no corpo daqueles que amamos. É preciso humanizar a vida para que ela não seja apenas um ponto final. Quem disse que era? Somos também nós quem faz a eternidade.

É fácil caminhar por meio de banalidades, facilitismos e justificações para todos os comportamentos possíveis. Também não é difícil encontrar gente desiludida de tudo e a tentar apagar a consciência que não se cala por um instante. A vida dá o que nós lhe damos.

Abro os caminhos de Novembro com a ingenuidade do miúdo que, sem ele mesmo saber porque o faz, pede pão por Deus. Calo as bruxas da vida que se vassoureiam em egotismos etéreos mas constantes, e permaneço fiel ao tempo e espaço em que a vida me conduz, porque a glorificação do intelecto em detrimento do abraço universal, é a desinteligência que desenterra sementes para as sociedades frias e egocêntricas, onde o homem com tanta informação e facilitismo se encontra mais perdido do que nunca.

Novembro como um farol, cujo nevoeiro dificulta a visão, turva o alento, mata esperanças, mas que uma vez transposto, nos regressa ao outro lado de onde nao devíamos sair: a partilha e o amor numa sociedade francamente mais civilizada e menos distorcida de tantos eclipses cujos sois detonamos.

Nada vale do que teorizamos na metafísica do viver. Nada vale sem o amor inteiro e não pluri-partido, como uma baby-sitter que presta atenção a todos e a ninguém! Porque como o Sol irradia o seu brilho e fulgor sem se importar com a sensibilidade de quem passa à luz, assim o Amor deve fazer, sem cuidar do egoísmo alheio. Muita gente vai por estes dias aos cemitérios, mas talvez, afinal, que os mortos sejamos nós.