6.2.14

PASSAGEM




Há uma espécie de carta que atravessa o tempo em forma de convite e de memória. Há muito que não sentia o ar pueril dos becos da infância, e dá-se um curto-circuito na alma. Como um tempo suspenso, uma nuvem que não anda, um raio de sol empalidecido nas moléculas do sentir. Um passo que pára, um caminho que se faz outro como um encontro connosco, inesperado e belo, um documentário real que não podemos alterar, só assistir com o tropel de emoções e nostalgia numa quase angústia de o querermos reverter e tê-lo ali, transformado e presente. Uma apreensão mista num sorriso quase triste, momento congelado na incapacidade de voar atrás!... Mas e se voasse? Outro caminho faria ou as cores seriam as mesmas daqueles luares e sóis que me trazem hoje? E retendo o momento tão directo ao âmago da construção, todo um tempo se atravessa e pede uma resposta que não tenho... Ainda revejo o canto na tela do infinito, mas não me posso deter muito porque, ao acordar, o passo terá de ser dado e as emoções embrulhadas em celofane de experiência que dará a cor que a existência não tem! Esta é vida, e tem sulcos e marcas de encanto e dor, mas nas ondas do presente, evoco esses traços como linhas pronunciadas no papel, onde o carvão se tornou indelével e coloriu este filme de uma emoção que se refaz, com glória e solidão, em forma de convite e de memória, por desertos sempre vivos de outra dimensão...