5.4.15

PÁSCOA DO AMOR

 
 
E Deus fez-se Homem e ressuscitou! Dizia o Manoel de Oliveira que a dúvida é uma maneira de ser; sei que só com ela podemos ir mais longe, avançar na descoberta de mais e melhor, sem estagnarmos em certezas afinal tantas vezes fantasiosas, mas a dúvida em si não chega; precisamos de desbravar caminhos, e mesmo cometendo erros, aprender com eles e continuar, sobretudo dentro de nós, no conhecimento do que julgamos adquirido. A dúvida serve para não nos instalarmos em atitudes autodesresponsabilizadoras, mas precisamos de trilhar caminho mesmo sem certezas da firmeza do solo. Não bastam as intenções piedosas, ou o não fazermos mal a ninguém; é necessário agir, ainda que tantas vezes o silêncio possa ser uma forma de comunicação. Mas precisamos de estar atentos em não ficarmos tão arredados em considerandos, que não vivemos com receio de tudo, incluindo o de agir. A dúvida pode ser um meio, mas não passa disso, e muitos pecados são perdoados a quem muito ama!
 
Deus ressuscita pelo exemplo do Seu próprio Amor, e certamente estaria longe das opulências milenares, mas também não nos pede o ar de queixume de quem não tem. Sabem lá os outros das minhas noites de dor ou das minhas madrugadas de angústia, ou sequer se terei um ombro onde reclinar a cabeça, e todavia não me queixo, não lastimo de forma pessoal as madrinhas más que a vida me dá. É a aprendizagem silenciosa do sofrimento, não para o consentir, mas para o aceitar entretanto! Todos convivemos com problemas e solidões, mas devemos mitigar a carga com o contrabalanço da entrega, da palavra amiga, do desabafo, do desbloqueio emocional que também se faz pelas alegrias simples que o dia e o momento têm. Esse é um dos problemas: esperar pelo dia, pelas férias, pelos anos, pelo natal, por quando tivermos dinheiro, por aquela altura... e entretanto a vida faz-se e o tempo dilui-se sem esperança nem entrega nem amor...
 
Faz-se Páscoa na abertura ao outro, na luta ao preconceito e ao medo do desconhecido, na capacidade de amar sem condições, e de interiorizarmos a máxima de Terêncio que dizia: "Sou homem; nada do que é humano reputo alheio a mim"...  Foi isto que Cristo fez, tão despido de falsas certezas, de dedos acusadores, de ideias preconcebidas! E quando com esta naturalidade e simplicidade soubermos viver, estaremos a contribuir para que haja páscoa à nossa volta em todas as mortes e renascimentos que todos os acontecimentos nos não-de proporcionar...
 
É desta Páscoa que vos desejo Boas Festas com o sorriso e a entrega, de quem, mais do que se queixar do que não tem, partilha o que lhe falta...