21.9.15

O PROZAC É O AMOR


Há muitas luzes de néon, muitas lojas sem nada, muito ruído humano. Muitas palavras debitadas de cor, muitos clichés, muita superficialidade. Quem é quem, onde e como? Faltam os coches da sinceridade e nobreza de espírito em vez dos bólides topos de gama. Falta o significado do gesto, de cada gesto, em vez dos rituais cegos e automáticos de cumprimentos e beijinhos e olás sem cumplicidade, encanto, ou delicadeza. Vivemos amassados por tanta informação, por livros e jornais, revistas e televisões, rádios e blogues. Vivemos anestesiados no poder tecnológico, no bramir do dinheiro, na angústia do futuro e de uma velhice confortável quando ainda mal sabemos o que é a comunicação da alma. Falamos sobre tudo mas não sabemos nada. Somos ignorantes da nossa própria condição. Habituámo-nos à personagem e não à pessoa. Falta humildade e serviço, bondade e modéstia; prevalece o ego e o endeusamento da pobre razão. A sinceridade passa a irrefutável certeza, o amor a orgulho, a ideia que fazemos de algo a convencimento, e rasgamos as estrelas até perdermos a mão no Infinito onde nem a noite nem a luz nem nada nos abre os olhos para a obesidade de seres informados mas pouco formados. Vivemos numa sociedade de taras, de sociopatas, de emergência do ruído, de palmadinhas nas costas. Vivemos num tempo onde juristas e psiquiatras são imprescindíveis. Patetizamos quem caminhe em sinal contrário, somos cordiais mas pouco autênticos, julgamos sem receios e agimos em conformidade. Os homens tornaram-se pouco pessoas.
 
Falta-nos conduzir o Tempo e não de ser levados animalescamente por ele. Falta-nos soltar as palavras belas e inconfundíveis como se fossem pequenas fontes de água fresca e não uma sucessão verborreica a imitar um esgoto que a espaços convulsos deita água suja ao mar. Falta o Encontro. Aquele em que saímos de nós. O Encontro que não é escravo do tempo nem da razão nem dos interesses dos amigos. Falta-nos a leveza de um pensamento leve. De não sermos mirabolantes a cada gesto, a cada ideia, a cada situação, como se tudo tivesse de ter segundas intenções ou se todos desejassem fazer mal ao próximo. Mas existe um remédio. Um remédio natural. Preenchidos na existencial necessidade de amar e ser amados, toda a nossa vida emocional se reequilibra e conjuga forças que já não pensávamos ou ousávamos ter. Só se perde quem não sabe, não quer ou não pode amar. Um amor que preencha e complete a essência que somos e para a qual fomos destinados, que nenhum Prozac, nenhuma experiência de vida, nenhum deus pessoal, nenhuma filosofia nem nenhuma energia cósmica, poderão alguma vez substituir.
 
Esse Amor exige porém, que seja genuinamente sentido, e não uma busca substitutiva do que não temos! Caso contrário, vive-se tristemente uma ilusão e pede-se o verdadeiro brilho porque estamos atados a um paliativo, mesmo que dure a vida toda... A fuga à solidão e o ancoramento em alguém, seja um filho ou uma suposta cara metade, é desonroso para nós mesmos, por mais nobres que sejam as intenções!
 
O Amor, o verdadeiro, é o Santo Graal da sabedoria. Esse Amor que pode ser, também, o Dom da Amizade efectiva, desinteressada mas empenhada, ali, sempre presente e não de quando em vez. O resto é a vida, com paciência para a levarmos, na cruz que temos de carregar, com a ajuda do Outro! Qualquer Outro! Um outro presente, que mitigue e faça sol mesmo quando chove. É todo um reequacionar da forma de viver. Porque nada valemos ou somos que não na entreajuda e na inter-acção. Fomos feitos para nos relacionarmos, e é desse saldo que resulta a plenitude do viver. Com tudo o que temos de melhor e de mais frágil...