14.2.11

QUEM QUER CASAR COM A CAROCHINHA?

O Amor não é um capricho nem deve ser vivido de forma fácil. Se é verdade que o encantamento e a paixão que predecem o amor se esfuma, não é menos verdade que essa chama deve ser mantida. E se é verdade que o amor não é apenas um êxtase de emoção e tem responsabilidades e dias escuros, continua a não ser menos verdade que o barómetro para amar passa sempre pelo coração, pelo afecto e pela emoção, antes do crivo racional. Porque acreditar numa união a dois só porque sim, ou porque o tempo se esfuma e há que arrepiar caminho, ou porque aquele ou aquela têm os ingredientes para dar certo, não foi, não é, e jamais será suficiente se queremos mesmo amar. Antes de mais é preciso sentir a chama que depois podemos transportar para outros níveis da vida, mas nunca acender algo que julgamos útil sob o pretexto de amor. 

No entanto, a ilusão da poesia amorosa também faz esquecer o essencial. Porque esquecemo-nos que o príncipe, nas sua versões masculina e feminina, é afinal um ser humano que se chateia consigo mesmo e com os outros, connosco e com o mundo! Que o príncipe encantado ou o amor com que sonhámos, mais não é do que a visão dourada de um homem ou de uma mulher com natureza humana igual à nossa. O exterior gasta-se, perde-se, dilui-se no tempo, pelo que só restará a essência, aquela que se depura com os anos, caso não a tenhamos percebido melhor antes. E é essa caixa preta que resiste a tudo e que guarda consigo o que temos para oferecer e para receber.
Também um dia o tal príncipe encantado sucumbirá ao poder do tempo, e toda a sua beleza física que tanto coração preocupou, desaparecerá, e não passará de um ser rugoso, porventura feio e fisicamente decrépito. Todo o Homem tem de morrer, mas mesmo quando formos parecidos com as folhas douradas das árvores prestes a despedirem-se do tronco, seremos ainda todo o fulgor que nos caracterizou na entrega, seremos ainda o esplendor da identificação mútua: mãos que se entregam, sentimentos que falam, olhos que percebem, rabugices que escapam ao tempo, mas príncipes encantados e perpétuos na essência, porque soubemos ver para além do castelo.

Sempre que não amamos é porque a razão interferiu na escolha. O amor, quando verdadeiramente sentido, envolve a pessoa num véu que outros não enxergam, mas que nos liga ao outro de forma única e singular. E só os motivos exteriores à vontade que impeçam uma eventual união, devem ser os espinhos no roseiral que nos levam a perceber a vida, mas não para nos determos nele lambendo as feridas e vivendo hipotecados por uma relação ilusória.

Cabe-nos gerir o amor como a primeira e última ratio do viver, deixando-nos de efabulações humanas alienantes, já que transferimos para um ideal o respeito que devemos a nós mesmos.


O príncipe encantado, ou a bela adormecida, que esperem também por nós! É que, por mais que nos custe (e custa), viver implica a sabedoria da inocência numa espera ou num encontro que não nos cabe determinar.