13.8.23

DIA INTERNACIONAL DA JUVENTUDE

 

Comemorou-se, este sábado, 12, o Dia Internacional da Juventude, e, ser jovem, independentemente da idade (até porque há jovens apáticos e adultos entusiastas), é saber ousar, arriscar o que em adulto parece mal ou não se faz.

E confundindo tudo isto com o politicamente correto, perdemos a noção entre elegância e vulgaridade, porque, elegante, será sempre sermos nós na condição humana da partilha e da comunhão do abraço, na tradução das nossas atitudes, e não o sorriso manipulado ou o cinismo da amizade encapotada e do jogo social.
Muitos descobrem na ajuda terapêutica, que, afinal, os grilhões que os impediam de algo, incluindo agir naturalmente, estavam precisamente na quantidade da energia gasta para o esforço de querer agradar a todos, necessitando de aprovação alheia, mas as nossas atitudes têm sempre consequências, mesmo quando não fazemos nada, porque também nada fazer é uma atitude por omissão.
Há uma diferença entre crescer e amadurecer. Já dizia Nietzsche "torna-te aquilo que és", ou seja, explora todas as tuas vivências, não fiques pela superfície de ti mesmo, vê-te na auto superação e não na negação, encontra em ti o que ainda não quiseste ver ou explorar, atualiza-te, e sê! Isto requer, obviamente, a humildade da autocrítica, ou essa viagem interior será uma falácia.
Até porque, caso contrário, seríamos apenas reféns do que nos interessa, e não credores da justiça, tantas vezes em direto conflito com o que não é, mas que, por falta de irmos ao fundo de nós, onde reside a reta consciência e não as camadas de crenças que vamos colocando, acabamos por nem saber o significado desse fundo onde não queremos muito mergulhar, porque desmontaria as nossas visões e crenças sobre o Outro, a vida, as situações e o mundo.
E, é por isso, que, comemorando-se hoje o dia internacional da juventude, vejam-se os desafios que são colocados aos jovens e a nós, porque a maturidade emocional não está necessariamente ligada ao crescimento.
Dizia o Papa Francisco nesta jornada mundial da juventude:
"O único momento em que é lícito
olhar para uma pessoa de cima,
é para ajudá-la a levantar-se"!
Quantas vezes somos nós que nos precisamos de resgatar de nós mesmos, quanto mais um autoconceito onde os inerrantes somos nós!
Não há inerrantes...
Se crescer é tornar-se adulto sem se adulterar, então quantos anões não há por aí...

27.7.23

NOTHING COMPARES TO ... WHOM




Sinead O'Connor... celebrizada pela bonita canção "Nothing Compares to You", que fala da dor da perda, do desencanto e do desgosto, de podermos fazer tudo o que quisermos, mas que "nada se compara a ti"!

É muito difícil o abandono, a ausência d@ "twin face"! Como é difícil o luto de outras emoções, que corrompe as fundações da nossa existência e razão de viver. Já dizia Oscar Wilde que, "onde há dor, o chão é sagrado"!

Mas a vida é simultaneamente o inferno e o paraíso, e as emoções são uma tão forte bomba nuclear, que paralisa o neocórtex, e coloca a vida em suspenso! Daí a importância em sabermos gerir as emoções, que tanto matam, como curam.

Não porque fosse o neocórtex a, absurdamente, nos dar o estímulo e a motivação de empreendermos uma jornada única, simplesmente única, a nossa, pessoal e intransmissível, a de cada um de nós, no desafio de viver, mas porque existem alturas em que também se pode morrer interiormente por excesso de amor...

E, quando, subitamente desapareceu de nós, é como se uma parte integrante nos tivesse sido arrancada: o coração, como sinal de amor romântico e universal, de piedade e compaixão, de sede existencial que não precisa do intelecto para ser feliz.

Neste tema musical, fala-se do amor amoroso, como podia ser do universal, do afetivo, do fraternal.

Mas podia ser qualquer outra dor, como a inevitável morte (física), que, porém, só a aceitamos obrigados, violentados, mesmo sabendo que todos somos mortais, finitos, pó.

E, então, na cruz da ferida de um coração rasgado pela dor de quem partiu, porque "nothing compares to you", acabaremos por saber, nesse vale de lágrimas que só nós podemos resgatar, mesmo com a ajuda de poderosos auxílios e ferramentas, que, na verdade, é com estranheza e humildade que, ao aquietarmos a angústia e a ansiedade, o "nothing compares to you", referia-se, afinal, a nós...

Não somos ninguém sem o Outro, mas também não somos ninguém sem nós...

1.6.23

DIA DA CRIANÇA

 


Ser alegre, não é estar necessariamente feliz, mas carregar com um sorriso libertador, aquilo que a vida não faz por nós.

Celebra-se hoje o dia da criança, e diz Bernard Shaw que
"não deixamos de brincar
porque envelhecemos;
envelhecemos, porque
deixamos de brincar"...

Ora, da infância, não devemos perder a inocência (que não se deve confundir com ingenuidade) e, é sempre nos gestos da verticalidade humana, que não se compadece de cinismos nem omissões, que nos realizamos como Pessoas.

Escrevia eu ainda ontem sobre isso, acerca do poema de Walt Whitman, que marca o clássico "Clube dos Poetas Mortos", no seu "oh captain, my captain!" Quem mata a criança dentro de si, perdeu o encanto e a magia e, com eles a inocência, o sonho e o riso.

Valemos pelas nossas atitudes, não pelos títulos académicos ou quaisquer outras medalhas sociais. Precisamos de liberdade e maturidade para entender o essencial, e não nos importarmos com o socialmente correcto! É, por isso, que eu jamais poderia, mesmo sendo o dia da criança, colocar uma foto de baloiço!

Se, como tão bem dizia Guerra Junqueiro,"crescer é tomar-se adulto sem se adulterar", então quantos anões não há por aí...

Um feliz adulto dia da Criança...
🫶

18.5.23

DIA INTERNACIONAL CONTRA A HOMOFOBIA

 


Jakub Jankto, internacional checo jogador do Sparta de Praga, assumiu a sua homossexualidade num vídeo nas redes sociais, partilhado também pelo clube que representa.

“Como toda a gente, tenho as minhas forças e as minhas fraquezas. Tenho família e amigos. Tenho o meu trabalho, que faço o melhor que posso, há anos, com seriedade, profissionalismo e paixão. Como qualquer pessoa, também quero viver em liberdade, sem medos, sem proconceito, sem violência. Apenas amor“.

Outras duas figuras relevantes na cena internacional que não o desporto, também assumiram recentemente que o são. Tomei apenas este exemplo.

Vem isto a propósito de o Parlamento Europeu e a ONU, terem declarado o dia 17 de Maio como Dia Internacional contra a Homofobia.

Ora, o preconceito, é uma defesa ignorante contra o que não conhecemos. É muito claro, que uma pessoa homossexual, difere de uma heterossexual, apenas no género do objecto do desejo.

A homossexualidade é um fenómeno de natureza tão biológica quanto a heterossexualidade, isto sem dizer que a sexualidade dos outros não é da nossa conta, tal como não é nada que só ao outro diga respeito, ou será uma intrusão e uma violação do respeito por cada um, seja solteiro, divorciado, cigano, de cor, mãe solteira, gótico....ou homossexual.

Ostracizar uma pessoa homossexual, homem ou mulher, é o mesmo que culpar alguém por ter um metro e oitenta, ou gostar do azul em vez do amarelo.

Aliás, um adulto que faz reparos ou outras manifestações homofóbicas, provavelmente não fez a transição para a idade adulta, e, eventualmente, poder-se-á ver nisso, um sentido frágil da sua masculinidade ou da própria sexualidade.

Os falsos moralismos e a incapacidade do aceitação do diferente, são obstáculos às pessoas homossexuais (não a sua homossexualidade), acabando por se verem impedidas de se realizarem afectivamente, hipotecando o Amor e, com ele, a capacidade de uma vida livre e feliz, o que é um absurdo, não apenas porque é, então, a sociedade que permite ou não a felicidade - sendo que a sociedade é a soma de cada um de nós e, por isso, cada um deve fazer a sua parte-, como porque o amor não tem sexo.

Somos fruto de uma cultura, mas também vítimas dela. Há que aceitar as diferenças, e de as pessoas viverem os afectos e a sexualidade na sua perspectiva psicodinâmica, e não apenas até onde as deixamos, sendo que, muito importante, não podemos restringir a sexualidade à genitalidade, e com isso não lhe perceber toda a sua linguagem e realização afectiva.


Na realidade, existe um estigma fortíssimo, directo ou omisso, contra quem não segue a suposta hetero normatividade.
O problema não reside na diferença, mas na rejeição à sua aceitação e, confundindo isto, arranjamos um silogismo social e cultural, que leva, no extremo, à pena de morte em determinados regimes, a sanções várias, ao bullying e à exclusão social.

Sempre que somos preconceituosos seja em relação ao que for, estamos a ser ignorantes da própria condição humana, uma vez que não percebemos conceitos básicos de respeito pelo Outro, entrando em caminhos medievais de despotismo pessoal, escudado no brilhante argumento da suposta normalidade.

Poderá um peixe dar uma volta pelos céus ou um pássaro viver debaixo de água? Se ambos não entenderem que a sua diversidade é, também, a sua identidade e razão de estar ali, que é a sua normalidade, vão passar a vida a tentar voar ou mergulhar, numa tentativa suicida de denegação existencial. E tantos são os que o fazem, precisamente pelas atitudes de marginalização e discriminação, individuais e colectivas, sem falar nos que têm uma imensa dificuldade em aceitar o que são...

E não se trata apenas de "tolerar" um comportamento; é muitíssimo mais do que isso. Porque para as pessoas amputadas à sua própria realização, pessoal e amorosa por meros interditos sociais, é, além de uma desinteligência colectiva, um drama para os próprios, como se amar fosse crime.

Que fique claro que não se trata de tolerar o Outro, ainda menos ser opinativo, sob pena de invasão do direito à vida privada, coacção social e discriminação.

Não escolhemos os pais, os colegas de escola, a condição física, como não escolhemos o género, a cor da pele, a raça ou a orientação sexual, tornando-se, precisamente por isso, um absurdo maior, rejeitar as diferenças do e no Outro; antes, devemos aceitá-lo, tal como acabámos por aceitar pessoas que antes tinhamos como escravos por não terem dignidade de seres humanos (juridicamente, os escravos eram coisas, podiam ser transaccionados e não eram entendidos como pessoas, não podiam ter vontade própria), ou que, sendo de raça diferente, deviam ser toleradas na comunidade.

E, no mundo dos afectos, não existe bitola, regra, lei, norma, jurisprudência ou mandamento que diga como é. É como cada um sente, na liberdade de ser ele mesmo, o Outro, aquele a quem devemos vénia numa reciprocidade respeitosa de quem comunga a sua própria humanidade.

O senso comum, é o pior inimigo que conheço, e, é assim que estamos em pleno séc. XXI: com a Internet numa mão, e a pedra lascada da ignorância noutra!

14.5.23

13 DE MAIO: FÁTIMA



Muito embora para a igreja, Fátima não seja um dogma de fé, ela é toda uma exegese de amor, é a razão a ser desafiada nos seus limites porque se revolta em não compreender o Mistério.

Na espiritualidade, razão e fé não se invalidam, já que, ao contrário das fadas e duendes, a ideia de Deus continua a ser racional.

Mas não se vive a espiritualidade nem se chega a Deus ou ao Mistério, através do esforço intelectual que dele possamos fazer.

É uma adesão interior, um caminho pessoal e único onde não entra o campo volitivo, tal como não escolhemos quem amamos numa lógica de um processo meramente racional.

A religião é apenas a vivência comunitária dessa adesão interior, onde as manifestações de fé acontecem como quem, gostando de ouvir música, não deixa, por isso, de ir a um festival ou um concerto, ou simplesmente socializa com amigos num café, porque a dimensão comunitária existe, independentemente da celebração individual dessa adesão interior de fé.

Fátima, tal como o Amor, estão para além da razão: não se explica: sente-se!


5.5.23

GOVERNO PORTUGUÊS: O PANTANAL



Não gosto de falar de política, mas também não podemos ser passivos a governos que simplesmente não governam, provocam, e estão em conluio, servindo-se, isso sim, a si mesmos.

Mal obteve maioria absoluta, o governo tornou-se absoluto, com a cobarde conivência do próprio Primeiro Ministro, nem que fosse por, constantemente, abençoar cada membro do governo, de sub secretário de estado a ministro e afins, sem jamais assumir qualquer responsabilidade, onde, em última análise, era sua.

Há sete anos no poder, Costa foi sempre igual a si mesmo.
Não existem problemas, o governo governa bem, não há corrupção nenhuma nem intrigas palacianas, não existe uma gestão à solta, criando ervas daninhas que vão atingindo cada vez mais o solo democrático, até chegar à raíz principal, o primeiro ministro circense, que, de tão habituado a terra podre que ele mesmo fomenta por inacção e apoio, também não o atinge a ele.

Com tudo isto, as ervas saudáveis à volta desse pântano - que teima em querer ser cada vez mais fundo, com o euromilhões da política oferecido pelos eleitores ao lhe conferirem maioria absoluta -, vão ficando sem espaço para se desenvolverem, e são mesmo apanhadas por um quase vazio de poder e por total ausência de autoridade.

Existe um Primeiro Ministro em cada sub secretário de Estado, em cada ministério, ou seja, só devem explicações a si mesmos dado que Costa até agradece dispensar-se de saber. É um "sirvam-se à vontade"!

Isto não me admira, porque em sete anos de poder , e já em ano e meio com maioria absoluta, a marca de António Costa é a gestão corrente e o encobrimento de absolutamente tudo, quer passando à frente, quer defendendo.
Nenhum político pode ansiar melhor governo, do que um liderado por António Costa: carta branca para tudo, livre trânsito em decisões irregulares, algumas ilegais, outras criminosas, como já antes fizera Sócrates, usando o erário público como se fosse uma conta particular, onde negoceiam sem ética, debaixo da mesa e com contrapartidas para todos. Pode haver melhor paraíso fiscal sob a capa da legalidade, já que falamos de um governo eleito?

Este não é o caso do "enfant terrible" Galamba, como outrora Pedro Nuno Santos, mas o culmimar de tanto lixo de ausência, não apenas de ética política, mas igualmente do sentido mais básico de falta de honestidade pura.

Se Galamba não tivesse encenado a sua demissão, para António Costa não a aceitar, perderiam ambos a face e, melhor ainda, deixariam de poder prosseguir livremente o caminho da mentira e, com ela, das ocultações, negações, e ilegalidades, simbolizando Medina (outro a mentir descaradamente) e as atitudes negacionistas de qualquer realidade por parte seja de que ministro ou adjunto for, na sua arte de bem iludirem quem lhes conferiu esse poder.

Na realidade, são três, os responsáveis pela passividade governamental: uma ditadura doce que todos engolem porque está cheia de blush. Do melhor.

Marcelo, pela estranha e inaudita conivência com Costa em nome de uma única coisa: estabilidade social e política.

Costa por tudo o que vem de trás, na sua genética política.

O povo português, porque foi no canto da sereia de Costa, quando, já depois da geringonça e com o orçamento de Estado recusado, vamos para eleições legislativas, e o seu mote é acenar com um Portugal à deriva caso não lhe dessem maioria absoluta depois de rejeitado o Orçamento de Estado que, imediatamente, levou à dissolução do governo e da Assembleia República.

Aproveitando a ideologia de muitos que, apenas por serem simpatizantes ou militantes de um partido, votam cegamente nele, bem como a ignorância de outros tantos que, com tanta dissimulação, acabam por acreditar que o governo é uma vítima e não o causador dos "casos e casinhos", somos chegados aqui.

Galamba simboliza, neste momento, o governo.
Marcelo, a ideia de ser preferível uma paz podre, à instabilidade, (cobardia politica), absolvendo desde o início e evitando qualquer crise, tudo o que viesse do governo. Como resposta pela ajuda, Costa paga-lhe agora, sarcasticamente, com ingratidão.

No meio disto tudo, onde ficam os portugueses? Certamente baralhados e sem melhor qualidade de vida e ainda com maiores entraves.

Mas porque é que António Costa defrontou tão seguro de si o presidente da República, fazendo um pacto com Galamba, simbolicamente representando todas as inconstâncias (digam-se manigâncias e trafulhices) do seu governo, com tudo o que está à mostra de nem uma medida estrutural ou macro económica?

E porque disse assumir todas as responsabilidades políticas, ao encenar a força do governo com Galamba e prontíssimo a ir a eleições?

Porque, tal como depois de ver o seu orçamento de Estado rejeitado, e, com ele, a dissolução do governo e da Assembleia da República, apelou ao voto massivo nele nas eleições, a fim de ter uma maioria absoluta, sem a qual, Portugal estaria perdido, e o povo deu-lha.

Logo, Costa está à vontade para prosseguir como o grande encobridor e o nada sabe, porque sabe que, no matter what, haverá sempre uma legião de portugueses que continuarão, absurdamente, a votar nele...

10.4.23

DOMINGO DE PÁSCOA

 



E chegou-se ao Domingo de
Páscoa, que significa transformação, conversão interior.

Faz-se Páscoa na abertura ao Outro, na luta contra as injustiças sociais, mas também nas cometidas por nós através do silêncio, ou porque não é nada connosco, ou simplesmente nos queremos dar bem com todos (mas quem não quer!?)

Quando não nos destituímos da obrigação de tomar partido perante qualquer tipo de desigualdade, discriminação, preconceito, injustiça ou abandono.
Quando, com dignidade, assumimos a nossa Cruz, mas não nos deixamos valer menos do que ninguém, porque não temos a mesma instrução académica, as mesmas posses, o mesmo status profissional ou influência social.

Porque não temos o mesmo número de amigos ou crédito de autoridade, e combatemos desigualmente com aquilo que somos, mas que desautoriza qualquer argumento que invoque uma posição inferior: essa dignidade de que falo, e que ninguém pode refutar, ainda que velada ou directamente nos ostracizem.

Valemos por quem somos, pela nossa formação humana, e não pelo que temos ou pelo aplauso do palco social.

Foi isto que Cristo fez, tão despido de falsas certezas, de dedos acusadores, de ideias preconcebidas, ou de negação de valores, e, com isso, se negarem também a si!

Pelo contrário, defende o frágil, o oprimido, Maria Madalena prestes a ser apedrejada ("quem nunca pecou que atire a primeira pedra" - como lembrei no texto de Sexta Feira Santa).

E sofre a dor da Cruz com dignidade, desejando desesperadamente não a ter, mas aceitando-a ao proteger as emoções, porque não o move a raiva ou a vingança, a maledicência ou a ignorância humana do outro, que embora o impactue no sofrimento, não é por ele provocada.

Absolutamente tudo tem um preço. E são sempre os mais altos que custam suportar. Mas não há preço que pague o valor de nos sentirmos Pessoas, e não meros seres sociais.

Faz-se Páscoa quando rimos com o Outro, porque paira sobre nós a pomba da Simplicidade e da Partilha, tal como, mesmo quando impotentes, irradia de nós a brancura do "estou aqui, simplesmente", autenticando que somos seres relacionais, e não imperadores do ego ou da soberba que, de resto, precisaria na mesma do Outro para pavonear a sua existência, no lado oposto da vida.
Viver, é morrer todos os dias, para todos os dias renascermos.

Desconstruirmo-nos, para nos reconstruirmos, com ferramentas que só a autocrítica, a abertura ao desconhecido e ao que difere de nós, a aceitação de toda uma complexidade humana que muitas vezes não compreendemos, mas que, talvez, não nos caiba ajuizar, nos poderão fazer entender o Mistério maior do milagre que somos, e da individualidade tão própria de cada Outro!

Nem sempre as pessoas precisam de conselhos. Muitas vezes, tudo o que precisam, é de alguém que as escute... e as abrace... E, também aí, se faz Páscoa!

E, se quando com esta naturalidade e simplicidade, soubermos viver, estaremos a contribuir para que haja Páscoa à nossa volta, em todas as mortes e renascimentos que todos os acontecimentos nos hão-de proporcionar...

Os meus desejos de Páscoa Feliz, são sempre desta Páscoa que vos falo, com o sorriso e a entrega dos que, mais do que se queixarem do que não têm, partilham o que lhes falta...

7.4.23

SEXTA FEIRA SANTA

 


É Sexta Feira Santa. À hora de noa, ou hora nona, correspondente hoje a por volta das três da tarde, Jesus morre na cruz, vítima de uma trama política e religiosa, e com um grau tão grande de stress, que o suor é sanguinolento (hematidrose, uma situação rara provocada por um violentíssimo stress).

Depois de ter orado no Monte das Oliveiras onde pede aos amigos que fiquem acordados com Ele, sendo que, entretanto todos adormecem, Jesus mantém-se toda a noite em profunda oração, como que preparando-se para o julgamento onde Pilatos não vê qualquer razão para o prender dizendo isso mesmo ao povo, mas a fúria para que Jesus fosse sentenciado e morto,

o clamor do povo, obriga Pilatos a dizer "Quem quereis que liberte? Jesus ou Barrabás?"

e todos gritam "Barrabás", já que havia o costume de libertar um criminoso pela Páscoa,

(tal como hoje existe a indulgência anual do Presidente da República a uma série de casos de prisioneiros que lhe são propostos, e verificando os mais "suaves" e o bom comportamento).

O próprio Pilatos fica enfurecido, volta para dentro, interroga de novo Jesus dizendo "não sabes que basta uma palavra minha para que sejas solto e não crucificado e morto? " Mas Jesus responde: “O meu Reino não é deste mundo. Se fosse, os meus servos lutariam para impedir que os judeus me prendessem. Mas o meu Reino não é daqui.” E a acrescenta " Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida"...

Pilatos pergunta-lhe: "o que é a Verdade?" mas Jesus não responde.

Pilatos não quer condenar um inocente, mas perante a exigência cega de um povo ignorante que antes o tinha aclamado, julgando que seria o libertador de todos os males, uma espécie de político que os livraria do jugo dos romanos, não percebendo que Jesus diz que as ordens instituídas devem ser respeitadas, mas não compactua, nem sugere qualquer insurreição,

porque o Seu papel é da revolução interior, revogando as normas do "olho por olho, dente por dente", fazendo antes a apologia do Amor fraterno, com os exemplos que dá, como o de Maria Madalena, que prestes a ser apedrejada por ser uma mulher adúltera (era esta a pena),
Jesus ao ver a situação, não teria muitos argumentos para a salvar, já que se cumpriam as tais leis que Ele vinha revogar, mas inteligentemente, interpõe-se entre a mulher e a populaça munida de pedras, e diz:

"Quem nunca pecou, que atire a primeira pedra"...

Isto desmontou qualquer argumento para iniciarem o apedrejamento público, e quando todos tinham dispersado, com Madalena totalmente incrédula (basta pormo-nos no papel dela que, por segundos, ia ser alvo de arremesso directo de pedras por todos, as vezes que quisessem e, provavelmente, até ficar sem vida numa morte horrenda), Jesus diz-lhe: "Vai...e não voltes a pecar"....

Perante esta revolução interior que Jesus traz, e não um político para livrar o povo da opressão, é pedida a Sua sentença, e Pilatos, irado por Jesus não querer renegar nada e irado pelo povo sedento de sangue, faz o gesto simbólico de lavar as mãos dizendo que a culpa de Jesus ser crucificado é deles, que nada tem a ver com isso, libertando, então, Barrabás...


Depois do Calvário com a Cruz às costas, como era o comum dos criminosos sentenciados que tinham de levar a sua própria cruz de madeira, pesada e enorme onde seriam crucificados num lugar fora das portas da cidade,

e passando à frente o estado em sangue e sem forças ao carregar a cruz, caindo por três vezes no caminho, de tal forma que os soldados romanos ao verem um homem vindo do trabalho, no campo, Simão, dizem-lhe que carregue ele a cruz um bocado, enquanto Jesus faz o caminho em interior antecipada crucificação, repondo-lhe, depois a cruz para a carregar até ao fim.

Quando já crucificado na cruz (contrariamente ao que vemos nas representações, as cavilhas, os pregos, não eram pregados nas mãos, mas nos pulsos, a fim de as mãos não se rasgarem com o peso do corpo),

dizia que, quando já cravado na cruz, com os seus amigos, os discípulos, e Maria a seus pés, e mais algumas pessoas que percebiam o absurdo e injusto de tudo isto, como o próprio Pilatos, mas havia uma questão política e religiosa, que poderia fazer com que se fossem queixar ao Imperador, (tal como a política, hoje, sempre movida por jogos de bastidores),

e Maria aos pés da cruz interiormente devastada, tendo acompanhado todo o percurso e totalmente impotente, Jesus, que ao orar toda a noite pedindo aos amigos que ficassem com Ele no sentido de acordados, chegou a pedir "Pai, se possível, afasta de mim este cálice",

vendo as lágrimas de Maria, e o sofrimento dos discípulos, diz do alto da cruz (onde foi feito rei por escárnio dos soldados romanos, que diziam "não eras tu que dizias que eras o rei dos Judeus?" pondo-lhe uma coroa de espinhos na cabeça, e dando-lhe vinagre na ponta de uma lança que chegasse à boca, quando Jesus diz aos soldados "tenho sede") ,

- não nos esqueçamos do suor em sangue que refiro logo no inicio, e de todo o outro, perdido durante a caminhada e pelas versgatadas, e sendo o sangue composto essencialmente por água, aquele "tenho sede" foi só mais uma forma para os soldados, novamente troçarem dele, dando-lhe uma esponja embebida em vinagre, em vez de água -,


Jesus do alto da cruz diz, então, a Sua Mãe:
"Mãe, eis aí o Teu Filho", e virando-se para João (um dos discípulos mais "afectivos" comparativamente a Pedro, cortava uma orelha a um soldado romano e sempre intrépido), diz a João: "Filho, eis aí a tua Mãe"...

Chega a hora de Noa, ou seja, cerca das três da tarde de hoje, e prestes a expirar, Jesus diz na cruz: "Pai, nas Vossas mãos, entrego o meu espírito...." E, dito isto, expirou, enquanto todo o céu se cobria dando-se um eclipse solar e um terramoto...

Escreve assim um paleontólogo: "A minha fé em Deus não é um puro assentimento racional a um credo abstrato. Deus não é uma ideia. Tão pouco uma divindade difusa no oceano dos confins do cosmos, como defende a New Age.

O grande problema de muitos cientistas é que mantêm uma imagem infantil de Deus e essa imagem não se dá bem com a maturação de uma visão científica do mundo. O conflito cognitivo não se resolve e quebra na parte mais débil: a experiência interior. Sem vida interior, não é possível crer."

Este "sem vida interior", ecoa muito em mim, porque considero-o uma das mais importantes razões pelas quais não se ama, não se partilha, não nos tornamos solidários, não chegamos ao Outro nem às suas motivações, vivemos uma superficialidade existencialista muitas vezes sem darmos conta disso, não conseguimos gerir as emoções nos momentos mais difíceis, nem sequer as reconhecemos ou o que nos estão a dizer... tudo porque não existe vida interior...

Curiosamente, Einstein diz algo praticamente igual ao teólogo paleontólogo: que "uma espiritualidade que não brota do contacto com a vida, com as injustiças de inumanidade, não é espiritualidade".

E quão verdade isto também é. Voltando ao paleontólogo, "Deus não é um puro assentimento racional, e sem vida interior não é possível crer",


eu diria mais: a Deus não se chega pelo esforço intelectual que d'Ele possamos fazer. Tal como não chegamos ao Outro apenas usando a razão: será sempre outra coisa, a sensibilidade, para compreendermos o que, pela razão, não há resposta e desconhece.

Sem sensibilidade, uma pessoa apenas com um elevado Q.I., pode ser um arrogante que não entenderá sofrimentos interiores ou simples gestos humanos, porque não é a razão que o explica...
Comparativamente, é aqui que entra a Fé.

Fé (que não é uma mera crença ou uma fezada ou um "acho que", vem precisamente de uma adesão interior, como duas pessoas que se tornam amigas para a vida, como os casais que se entregam e partilham mutuamente a sua realização);

E Fé e razão são caminhos distintos que não se invalidam, tal como não se ama alguém por um esforço intelectual, porque é necessário Sentir. Explicar porque se tem Fé, ou acredita, é como explicar porque se amam os filhos e, estes, os pais.

A resposta está no Sentir, não na explicação...

"Contacto", um filme de ficção científica do livro de Carl Sagan, com Jodie Foster, trata com muita honestidade intelectual a razão e a fé, fazendo Jodie Foster de cientista que tenta perceber um sinal que vem de Vega, a 26 anos luz, tendo os políticos tomado controlo do projecto, e decidir o que fazer com a comunicação, sem descurar as implicações religiosas, tendo por isso um padre/teólogo,representado no Conselho, o padre Palmer Joss (Matthew McConaughey).

Quando, no fim, a cientista o interpela relativamente à experiência, como que," em que ficamos nisto tudo porque eu viajei, experienciei embora na Terra digam que nunca saí do lugar e que se passaram apenas alguns minutos, afinal onde fica a ciência nisto e a religião?"

(embora não conseguissem explicar a errática do filme correspondente ao tempo em que cientista experienciava todo um outro mundo, mas totalmente descredibilizada), o padre responde à cientista:

"A diferença é que procuramos o mesmo;
apenas por caminhos diferentes".

Isto lembra-me Theilhard de Chardin, quando diz que:
"não somos seres humanos
a viver uma experiência espiritual;
somos seres espirituais
a viver uma experiência humana...".


É Sexta Feira Santa, quando a Ucrânia é invadida e um país quase dizimado, e continua...

É Sexta Feira Santa quando os poderosos nada fazem do que dar sentido ao dinheiro mas não à vida;

É Sexta Feira Santa, quando pessoas sofrem no silêncio de uma depressão que só ela sabe ter;

no esforço de quem tendo tão pouco, sobrevive sem a esperança de uma vida melhor.

É Sexta Feira Santa, quando se carregam cruzes insuportáveis, doenças incapacitantes, diagnósticos com pouco tempo de vida, traições, solidão...

E, é em todas estas dores, que Jesus expira na Cruz, fazendo-se Homem que conhece a nossa dor e por ela dá a vida.

É a Fé que vem sempre de dentro, num encontro pessoal de certezas, que só a dúvida desfaz...