23.4.14

AMOR E LIBERDADE

A liberdade é um estado de espírito, mas o amor não. A liberdade constrói-se, vive-se e actualiza-se, mas o amor impõe-se! Para uns está tudo bem, desde que não implique com eles, desde que nada tenha a ver com eles, mas nunca nada pode estar bem quando simplesmente nos apercebemos de que há coisas que simplesmente não deviam acontecer! Nesse momento não é o nosso egoísta quadrado de existência que está bem só porque não tem directamente a ver connosco: somos co-responsáveis pelo mal, quando nos escudamos na aceitação dizendo que não é connosco! Santo Agostinho dizia: "ama e faz o que quiseres"!... Ora ser livre e amar são muito próximos, mas é também o amor que dita a liberdade e não o contrário. O amor quere-se inteiro, renovado e responsável! Quem não ama não é livre! E o sofrimento que possa implicar é a marca e o estado adulto dessa genuinidade, porque a aceitação de que amar não é um estado hipnótico-lírico, é em si mesmo perceber que se constrói percebendo as falhas e exigindo sempre mais da nossa responsabilidade! E só assim se pode criticar quem o descura e ostraciza, encontrando no seu infantil estado de suposta liberdade, aquilo que afinal são caprichos e falta de caminho. Não há amor sem responsabilidade, logo sem sofrimento, nem liberdade oriunda de um vazio existencial. Só quando integramos que a liberdade provém do amor, que por sua vez requer todo o nosso edifício intelectual e afectivo, nos estamos a realizar como pessoas totais, inteiras, responsáveis, assumindo que nas pedras da vida se faz caminho, se cresce e perdoa, para nos reconhecermos também em situações que só ao outro imputávamos, mesmo que o perdão exista como necessidade de prova a nós mesmos, i.e., que o fazemos tanto pelo outro como por nós, porque tal como o amor, implica uma maturidade cada vez maior, não para aceitar o gesto da ofensa, mas para sarar os efeitos provocados! Só quem não ama, não volta mais!
 
O amor desculpa, perdoa, mas também exige, e tanto mais quanto mais a nossa caminhada nos  aperfeiçoa! A questão da responsabilidade e do auto conhecimento andam juntas! E a pedagogia do amor é também o seu próprio serviço. Tudo o que se passa com o outro também nos diz respeito, porque só combatendo o erro se pode tentar disseminá-lo, mesmo que em si tenha sido uma aprendizagem. O problema não é tanto o erro em si, mas reincidir nele, e tantos há que o justificam. A esses, é longo o caminho, mas porventura também perder-se é uma forma de se encontrar...
 
Estamos sempre comprometidos: basta sabermos que partilhamos a condição humana simultâneamente forte e frágil, avassaladora e complexa, simples e incomensurável! Talvez que a vida seja neutra, e nós é que lhe conferimos cor ou ausência dela, amor ou sofrimento, simplicidade ou complexas equações de viver... Em última instância, é sempre na simplicidade e seriedade das coisas, que encontramos alegria para sermos em plenitude, e não uns humanos sonegados indignos de sermos pessoas. Basta recomeçar com tudo o que já matamos, com tudo o que já elogiamos, e sentir essa liberdade própria de que falava Santo Agostinho na mais perfeita síntese de liberdade: Ama... e faz o que quiseres!