14.5.09

Matem o Papa



Eu penso que devemos respeito a todos. E o Papa é igualmente uma pessoa de bem. Já li comentários de pessoas a dizer que por elas lançariam uma bomba atómica sobre o Vaticano, ácido sulfúrico para cima desta gentalha toda, etc etc etc.

Penso que crentes e não crentes devem ser críticos em relação à política, à sociedade, à religião, à cultura... mas isso não lhes confere o direito de achincalhar as pessoas que, por mais desonestas ou desonradas, merecem respeito. Claro que é difícil entender-se o respeito nos países islâmicos e não só, onde o terror político, social, pessoal e humano imperam, mas entre falarmos de ditaduras, de discordâncias politicas ou culturais ou religiosas, saibamos fazê-lo com o mínimo de elevação.

Não me parece que os dentes afiados e as críticas corrosivas levem a algum lado. Muitas vezes afirmamos que temos o maior respeito pelo outro, mas é formal, não é interior, é show off. Ter respeito é fazer coincidir a atitude e o coração, e não apenas palavras bonitas de que devemos respeitar todos, e claro que ninguém vai dizer que não respeita, mas no fundo têm ódio de morte. Isto aplica-se a cada um de nós no nosso quadrado de existência como a qualquer pessoa no mundo em geral. Acenamos que sim, que respeitamos, claro, mas se pudéssemos dar asas aos nossos instintos básicos e primários, nem a faca era precisa para anular o outro. E há muitos maneiras de o fazer.

Sobre o Papa, ele sabia que a sua visita ao Médio Oriente não iria ser fácil, dadas as cicatrizes com que os conflitos politico-religiosos marcaram aquela região e os seus povos. Ao chegar a Israel o Papa teve a confirmação da dificuldade da sua peregrinação de paz. Apesar da atmosfera tensa ele mantém o ar calmo que o caracteriza e prossegue o itinerário que traçou antes de deixar Roma: visitar e orar nos lugares santos de judeus e muçulmanos. Em defesa da construção da paz.

Abriu mesmo um precedente ao ser o primeiro Papa a entrar na mesquita dourada ou Cúpula do Rochedo, descalçando-se,muitas vezes referida como o terceiro local santo do Islão. Orou também junto ao Muro das Lamentações, tudo para de forma muito especial e determinada, defender Jerusalém como a "cidade universal da paz". Apenas isso.

Entretanto apoia a criação de uma pátria soberana palestiniana, critica a manipulação ideológica da religião e afirma o respeito pelo Islão entre outras coisas que não ando a seguir a viagem dele. Mas quis deixar este apontamento. Sejam crentes, ateus, agnósticos, mas sejam-no com elevação. O mesmo noutras áreas da sociedade em que vivemos. Todos apelamos a corações abertos, respeito e mais não sei o quê, e todos confirmamos esse mesmo respeito. Mas será que é mesmo verdade? Respeitamo-nos uns aos outros MESMO ou simplesmente o dizemos porque ficaria mal dizer o contrário?

Eu tenho crises de fé, porque a fé é um dom e não se incompatibiliza com a religião. Não se chega a Deus pelo esforço intelectual que d'Ele possamos fazer, e a Razão e a Fé são conciliáveis, apenas com métodos diferentes, porque também não cabe à razão experimentar o meu amor por alguém, nem à agricultura definir se aquele edifício está esteticamente bom, ou à culinária pronunciar-se sobre o Cosmos. Se o pai natal, e os duendes e as fadas madrinhas fazem parte do imaginário necessário a um crescimento saudável psico-afectivo de qualquer criança, a ideia de Deus não se perde com o crescimento intelectual.

blogues que falam visceralmente mal de tudo. Não do Papa em particular. E ironias à parte quando se criticam situações e são ironias muitíssimo bem feitas e hilariantes, há aqueles blogues e aquelas pessoas que criticam tudo e todos: uma parede mal pintada, um Papa de quem nada sabem a não ser as palavras debitadas nos media (sabiam que por exemplo o papamobile onde se desloca o Papa tem um motor da Ferrari que custa milhões porque a Ferrari o quis oferecer ainda no pontificado de João Palo II? E o que vem na comunicação social? Vaticano tem papamobile com a última geração de motores da Ferrari. O que se deduz? Que o Vaticano comprou. Sabem que Prada quis calçar o papa? E vem nos media "Papa calça Prada" o que se infere que ele mandou comprar. E sabem das obras e instituições da Igreja que no silêncio, e por todo o mundo, fazem mais que governos inteiros?

Não estou a defender o Papa, que o considero conservador mas digno e justo, mas não o achincalho nem deixo de ver as motivações do que diz, possa ou não concordar. Se nos tivermos a nós mesmos como guias inerrantes de tudo, então seremos os únicos que estamos certos à face da terra. E se nos considerarmos assim, então ninguém estaria certo porque cada um tem a sua visão e prisma que devem ser respeitados tal como as críticas devem ser feitas com o mínimo de elevação e não com maldade encapotada, quando não directa.

Não defendo o Papa. Defendo o Respeito e a Justiça, mesmo quando dizemos que sim, mas na realidade é só para ficarmos bem na foto.

Será que não há pessoas boas no mundo e se houver são apenas aquelas que no nosso conceito permitimos ser? Será que as estradas são todas tortas, a comida é toda intoxicada, os supermercados estão armadilhados com bombas que podem detonar a qualquer hora, nenhum edifício é bonito, todas as pessoas vestem mal, as nuvens movem-se depressa e o sol não vem, a chuva há-de ser culpa de alguém, a net quando enguiça já se sabe que é defeito próprio, as pessoas que comentam diferente de nós são autênticas bestas que precisam de uns belos comentários ou interpostos puxões de orelhas para saberem o que é a verdade, a posição correcta face seja a que situação for?

Matem o Papa, vá. Mas a seguir mais ninguém ficaria no mundo, a começar pela cobardia ilustrada com brilho de respeito da própria pessoa que acossa o seu semelhante, que está em todo o lado. Somos virtuais mesmo na rua. Está uma pessoa estranhamente a precisar de ajuda e não me refiro aos mendigos. Que se arranje. Querem deixar passar? Vão-se lixar. Enfim, sabemos sempre tudo, somos sempre inerrantes, dizemos mal de tudo, achincalhamos seja quem for, mas dizemos sempre: "eu respeito as diferenças. Eu respeito o outro".

Vá lá. Matem o Papa, já que não têm coragem de matar o vosso dark side. Por mim tento ser justo, mesmo que isso se volte contra mim. Porque não são apenas posts bonitos de poesia ou blogues onde todos temos os mesmos interesses e como tal, trocamos galhardetes. A paz é aquela que se vive no meio da luta, mas lutar não é matar. É honrar a própria honra... de quem ainda a tem.


Até já.