1.10.09

SABES QUE SE PODE MORRER DE SOLIDÃO?


Decidi voltar ao tema do post anterior porque li comentários (que desde já agradeço) que me pareceram muito pertinentes, mas onde ficava sempre uma certa confusão entre silêncio e solidão. Geralmente não sabemos quem verdadeiramente sofre. As pessoas que mais sofrem são as que menos o mostram. Podem ate mostrar-se muito sociáveis e despreconceituosas, mas a dor persiste tirânica e as lágrimas são derramadas em silêncio.

O Homem foi feito para amar (entendam o amor da forma que quiserem). O Homem é, por natureza, um ser relacional e, todavia, gravita indefinidamente à volta de si mesmo, dos seus preconceitos e verdades absolutas, e esquece que o amor não tem correntes: é oblativo, entrega incondicional, e é por isso que quando as pessoas vêem muito amor, desconfiam, porque pensam sempre que terá de haver contrapartidas para tão grande desinteresse. A Amizade também é isso, mas quando queremos tornar os amigos exclusivos, passou a ser manipulação. E embora o Homem seja um ser relacional, necessita também do silêncio. A outra face da mesma moeda. É por meio dele que crescemos, que vemos se o nosso espelho nos diz o que queremos ou o que realmente somos, e é por meio dele que alimentamos a alma, que nos colocamos acima dos outros animais, que contemplamos e nos esvaziamos para podermos simplesmente ser.

Todavia, houve alguns comentários em particular que tentaram estabelecer a diferença - tal como eu tentei explicar no post - entre silencio e solidão. Mafa_R escreveu que “Solidão não é, não pode ser o querer estar sozinho. Há no ser humano necessidade de contactar com outros e, quanto a mim, Solidão é o sentimento que se tem de rejeição por parte dos outros. E isto pode doer muitíssimo.” O André Couto foi, talvez, quem mais tentou desenvolver o encontro connosco mesmos nesse necessário silêncio (e como me identifico contigo, André, quando dizes que “Dias há em que movo montanhas e nada me trava, noutros apenas o peso da minha existência se torna algo quase insustentável”, mas isto já somos nós a ir mais longe para além das supostas definições. Identifiquei-me muito mesmo, até porque tenho uma energia irregular. Mas voltando aos comentários sobre silêncio e solidão, tout-court, e sob pena de me ter explicado mal no anterior post, daria a minha opinião mais concisamente onde, de facto, diferencio o silêncio da solidão.

Salvo melhor opinião, tenho para mim que a solidão vem sempre acompanhada de dor, pelo que não penso haver solidão voluntária: há gostar de estar só, mas isso não é solidão porque não está associado a um sofrimento auto-infligido ou não; é apenas o prazer de gostar de estar só. Solidão implica dor, abandono, desalento. Estar só, não. E estar só (silêncio) é factor de crescimento, tal como quando levamos com amarguras em cima, traições ou difamações, porque ficamos a conhecer melhor a natureza humana (e/ou aquelas pessoas em particular) mesmo nos que se dizem os melhores sob a capa de grande naturalidade e humildade. Mas acredito que estar só é crescermos, é alimentarmos a alma, é estarmos connosco para nos podermos ter a nós próprios, sob pena de termos uma pessoa que nem nós conhecemos jugando conhecer muito bem: nós mesmos.

Como digo mais acima, fomos feitos para amar, para nos relacionarmos, o que implica o auto-conhecimento, os espaços de silêncio (a mais ninguém é dado contemplar o mar, a beleza, as estrelas, o seu próprio silêncio, do que ao Ser Humano). É pena que o Homem, com todo o progresso, se tenha esquecido que há homens cujo valor e dignidade não reside em rigorosamente mais nada do que no amor que brota de si mesmo. E esse amor já requereu o silêncio de si. Mas não a solidão. Essa, suponho que só a solidão dos próprios pensamentos. O resto é silêncio, arejar o espírito, crescermos, estarmos deliciosamente sós connosco mesmos, qual brisa silente num dia de calor. Sem o silêncio de nós, seríamos tão mais ruidosos, que nem a nós nos suportaríamos. E quem nao faz silêncio dentro e fora de si, não está em condições de crescer. Como dizia no post anterior, quando nos sentimos sós (de solidão) não é por não termos outros: é por não nos termos a nós mesmos...
Até já.