26.1.09

Deus Existe?


Ponho-me a pensar sobre os autocarros que actualmente fazem publicidade, uns a dizer que Deus existe e outros a dizer que não, nomeadamente em Londres e Madrid.

Remonta ao seu próprio aparecimento, a controvérsia que sempre se gerou entra a ciência e Deus. Dizemos que não sendo possível provar Deus, logo não existe, e então a sua validade será igual à do Pai Natal, dos duendes ou das fadas madrinhas. Nada mais falacioso, elementar, simplista e redutor. Acreditar nestes entes faz parte do crescimento psico-afectivo da criança (e mal das que não sonham o mistério), mas uma vez tornada adulta, a criança discerne pela razão, não o absurdo da crença, mas a efabulação necessária que houve, com elementos constitutivos do crescimento como os seres mágicos. Transmitida embora de forma diferente em criança e em adulto, a ideia de Deus não deixa de ser racional, o que já não acontece com os seres míticos das fadas ou duendes.

Não há qualquer lógica em concluir que por Deus não ser uma realidade científica, i.e., mensurável, quantificada, experimentada, não exista. Cientificamente não existe a beleza de uma sinfonia, mas um debitar de decibeís. Não existe estética, nem amor, nem arte, nem nada na ciência que não a mera prova pelo método científico. A ciência é amoral. É-lhe indiferente que amemos ou repudiemos alguém. Ou seja, não podemos legitimar a ciência naquilo que não é seu.

A ciência simplesmente se deve limitar ao seu campo (por natureza restrito). Não podemos forçar a razão para além dos seus limites. O Homem está para além de si. Pretender, por exemplo, que o registo da actividade cerebral na sua vasta complexidade poderia vir a explicar e determinar uma realidade que é transcendente, é sermos intelectualmente arrogantes, deificando a nossa própria existência.

A ciência é o resultado do Homem na conquista do saber. Somos inquietos, queremos mais. Passamos a ver o mundo como ele é, e não como julgávamos que fosse. Tiramos proveito disso. É o progresso. Mas saibamos ter a humildade de não legitimarmos à gastronomia o estudo dos quarks, ou de pedir à religião que se pronuncie sobre as células cancerígenas. E ironicamente até pela mecânica quântica a probabilidade de algo ter surgido do nada é muito remota.

Decididamente, Deus não se alcança pelo esforço intelectual que dele possamos fazer. Porque Deus ultrapassa a finita razão, e o finito não pode conhecer o infinito. A razão é um simples instrumento que não percebe nada de amor. Aceita-o, porque se compreende racionalmente, mas não entende. Razão e emoção são por natureza antagónicas, e no entanto não se invalidam; apenas não se imiscuem. O mesmo com o amor a Deus, que não é um capricho ou um sentimentalismo cor de rosa, mas uma responsabilidade consciente. Entra, então, a fé que mais uma vez supera a razão. Somos, de facto, limitados. Se um homem numa ilha não pescar por desconhecer a existência de peixes, tal não invalida a sua existência.

Como diz Michel Renaud: “O ser humano é hoje confrontado com tantas racionalidades diferentes, que abandona a ideia da unidade da verdade, duvida da razão e torna-se céptico”.