4.3.09

Mistério de Amor


Abocanha-me a mais profunda nostalgia. Derrapo na mais visceral tristeza. Desaguo num dique contido. Há como que uma energia avassaladora que estilhaça pedaço por pedaço toda a minha emoção. É desigual. É doloroso. É o diagnóstico continuado que me introduz no clube dos lobos solitários.

Tapam-se os diques, contém-se a tempestade, ganha-se o mundo. E enquanto os grupos mentem a densidade individual, enquanto a música se metamorfoseia em decibéis e melodias imediatamente apropriadas pelo sentir unívoco de cada um, encontro-me numa esplanada à beira rio dantescamente invadido por um calor humano que não é meu.

Sou errante peregrino dos caminhos que não vêm nos roteiros.
A música é bonita mas não me faz sentir o ímpeto da emoção, ou melhor, não me deixa sentir a alegria despreocupada de quem desfruta a vida sem conhecer a ossura da carne.

Atravesso-me no horizonte que a vista me proporciona e quase deixo de sentir. Depois caminho para nenhures. O que importa? Só o amor materializa os lugares. Da dor nascem roseirais, mas as minhas rosas não têm espinhos! São absolutamente inermes.

Entro numa igreja. Não procuro paz ou silêncio, ou o toque indizível unicamente feito pelo coração. Esse já o tenho - e dói - porque não são os lábios que o fazem. Turvariam a fonte de onde emana o sagrado perfume das pétalas gastas.

Procuro Deus, deixo-me de modéstias e reverentemente agradeço ajoelhado a audiência. Sou como um nobre paladino antes de ser armado cavaleiro. Depois deixo que todo eu seja luz, energia, escuridão! Deixo que o silêncio sepulcral me sepulte nalgum pequeno jardim que não tenha sido atingido pela tempestade do vazio. Ergo as mãos e o olhar. Abrem-se-me sulcos no rosto. As palavras não saem. A emoção é tão sublime, tão delicada e tão frágil, que só a campânula do silêncio a pode proteger. E cala fundo. Muito fundo. Tão fundo que me converto noutro. A borboleta passa a crisálida. O processo inverte-se. É o sentido contrário da minha vida, onde só uma aviltante hipnose descortinaria que algures nesse profundo eu, existe um imenso jardim.

É o espinho da rosa tornado mistério de amor...