As Festas dos Santos Populares não são o Teatro Nacional de São Carlos, uma ópera, um concerto de música erudita, uma palestra literária ou um bailado russo. Também não são um concerto de música hard-rock, eléctrica ou uma rave. São, tão-só, a manifestação popular da devoção aos respectivos santos, numa componente lúdica de bairros, cada qual pretendendo mostrar o seu melhor, com as decorações, as bandas, as marchas, os padrinhos e madrinhas, os arraiais em si (mais ou menos ricos) com sardinhas, tascos, sangrias, vinho, batata a murro, vendedores de ocasião a vender "nogauhts", amendoins e algodão doce, e todo um ror de pequenas grandes coisas que cada bairro, cada cidade, por sua vez, tenta engalanar da melhor maneira, atraindo pessoas de fora e de dentro numa festa que não é exclusiva de ninguém, que não carece de convite nem de fato, e onde cada um é exactamente aquilo que é, porque está ao ar livre, porque fala ao telemóvel, ri, dança, senta-se, come, bebe, observa, não faz nada, sem quaisquer imposições como num teatro, num cinema, numa palestra, num "cof cof" a mais...
Sempre gostei dos santos populares. Vejo as pessoas a passarem de barco do outro lado de lá da margem dirigindo-se para Lisboa e a fazerem o sentido inverso quando terminam as festas, que os barcos não duram até às tantas embora se prolongue o horário, tal como comboio da linha de Cascais, com pessoas de vários quadrantes e cores segurando vasos com manjericos, ainda lendo os papelinhos que lhes coube em sorte, risos estampados no rosto, fazendo dos transportes públicos um prolongamento natural de uma festa que não podia terminar apenas porque se vieram embora, e por isso seguram os vasos e riem... e os barcos e comboios transformam-se num palco ambulante de quem se divertiu muito e bem numa noite que é de todos.
Gosto muito de ver toda esta emoção e cor. Porque é natural, porque é povo, porque é Amália (costumo dizer que sou muito Amália, muito povo, no sentido da naturalidade e da espontaneidade) da mesma maneira que admiro pessoas assim. Simples, naturais, sinceras, com quem podemos sempre contar, embora possam igualmente ter gostos mais rebuscados por outras áreas mas que não deixam, por isso, de ser simples. A inteligência por si só de nada vale se nao houver sensibilidade (ou seremos arrogantes) e a sensibilidade remete para a natureza de cada um mas deixando entrever a honestidade, a naturalidade, a franqueza do sorriso e da partilha, o deixar que precisemos do outro, e assim sermos verdadeiramente pessoas. E só por isso, escrevi este post. Porque sendo o Santo António em Lisboa, o São João no Porto, o São Pedro (em Sintra e noutros lados, certamente) e os santinhos da devoção popular um pouco por todo o lado embora em alturas diferentes, importa que ali as pessoas SÃO, natural e espontaneamente, como um único coração na praça grande que são as ruas e a vida.