Não me tenho mais do que à vida e é por isso que me dou.
Em nome dos que sofrem na humildade da vida e dos que esperam autocarros carregados de sacos,
em nome dos que fazem dos transportes públicos o seu BMW,
em nome dos que sorriem ao ver as promoções de férias com a habituação de quem não pode,
em nome dos que reconhecem na chuva o amigo genuíno e presente que lhes falta,
em nome dos que escondem as lágrimas por vergonha,
em nome dos que não dormem e só adormecem na dura realidade,
em nome dos que não invejam nem maldizem, nem fazem da sua vida um umbigo egoísta,
Em nome dos que caem de pé e se dignificam pela queda,
em nome dos que riem muito e aparentam muita força mas vivem andrajosos numa alma envergonhada,
em nome dos que clamam por justiça sem por isso injustiçarem ainda mais,
em nome dos que ousam ser pessoas e reconhecem com tristeza os cinismos enganadores...
Em nome dos que morrem sós tão acompanhados em vida,
dos que vêem num olhar um secreto mundo de harmonia e paz,
dos que acreditam sempre no sol mesmo que este se eclipse durante toda uma estação,
dos que não se querem mais do que à vida...
Em nome de todos eles
também eu estou escondido
entre as mãos únicas de quem me trouxe ao mundo,
e cuja caminhada é de uma fealdade bela
no deserto onde me bebo e sou,
vendo espelhado nos meus próprios passos
o caminho doloroso e só de tantos caminhantes que
têm o luar por amigo e a noite por confidente,
impressivas vidas que diariamente acordam e
se refazem em nome do que são.
Mas também em nosso nome
a alegria de viver, serena e triunfante,
como quem ergue a espada da justiça
sem deixar cair a lâmina fatal
numa compreensão livre de que o melhor
é quem é e não quem se diz,
sorrindo num encolher de ombros
que desconta nos outros o crescimento tardio,
voltando à concha que permanecerá entre as ondas e a areia num
testemunho pessoal de quem quiser passar...
E o mar continua
brilhante e belo,
vigoroso e livre...
também ele a sorrir
na sageza do mundo,
que tanto repreende
o arrogante e o avaro,
como dócil beija os pés
dos humildes na areia...
Porque estás triste num dia tão belo, perguntas inocente!
A tristeza é uma tensão de equilíbrio,
respondo-te sem mover os lábios.
Deixa-me estar assim que já volto ao sol que me conheces!
Até lá, e em nome de,
preciso de homenagear comigo
os que não se têm mais do que à vida, e é por isso que se dão...