10.10.23

DIA MUNDIAL DA SAÚDE MENTAL

 



Celebra-se hoje o Dia Mundial da Saúde Mental. E quanto mais falarmos sobre a nossa saúde mental, mais combatemos o estigma associado. Ao diminuir o estigma, as pessoas sentem-se mais à vontade para procurar e receber apoio.
Por definição, a saúde mental é um equilíbrio entre o bem estar emocional, psicológico e social, ou, se quisermos, a capacidade de lidarmos emocionalmente com as adversidades, e, por isso, a enorme importância que tem nas nossas vidas.
É que a saúde mental vai afetar toda a nossa qualidade de vida, determinando a forma como lidamos com as situações do quotidiano, o trabalho, as relações interpessoais, atividades sociais e por aí fora!
Mas também é importante dizer, e nem sempre o vejo assinalado, que a saúde mental não é definida apenas pela ausência de uma doença.
Uma boa saúde mental, significa sermos capazes de reconhecer as nossas qualidades e potenciais, e sabermo-nos adaptar ao normal stress do dia a dia.
Uma das formas de a termos, é a autocrítica, o conhecimento sobre nós mesmos (sem o qual não compreenderemos os outros), a humildade para irmos fundo dentro de nós, sob pena de o nosso ego impedir o reconhecimento de zonas sombrias ou erróneas, que possamos, (in)conscientemente ou não, (saber) ter.
Sem primeiro nos avaliarmos e descobrirmos, não vale a pena reclamar dos outros, porque, nem sequer, nos conhecemos a nós!
É que nem sempre estamos para parar um pouco, avaliando aquilo que realmente nos move, e sem essa auto atitude crítica, somos reféns de crenças pessoais que tomamos como irrefutáveis.
Isto vai afetar tudo na nossa vida, como a relação connosco mesmos, com os outros, com as situações.
Com os nossos sentimentos de raiva, inveja, soberba intelectual, arrogância, vaidade exagerada, orgulho, preconceito, iliteracia emocional, porque eu é que sei, porque nunca nos desconstruímos, nunca ousámos olhar para quem somos, ou fingimos e acreditamos que é ridículo porque somos muito inteligentes, temos opinião sobre tudo e, como tal, seria um absurdo (re)conhecer-me!
Tudo isto nos enviesa a perceção da realidade, e, por isso, continuamos doentes da nossa única visão, e arrumamos os problemas encerrando-os nos outros. O mesmo é dizer: eu nunca estou errado, é a minha opinião e julgamento. Se existe algum problema, obviamente está no outro!

Repito: se não nos descontruímos todos os dias, para novamente continuar o caminho, estaremos sempre na nossa versão primitiva, original, que nunca se atualiza, e sem um maior conhecimento e compreensão sobre nós mesmos, continuaremos a justificar e acusar tudo, fora de nós, acabando por nunca compreender a real dimensão do que se passa.
É a velha história de, um onde vê um seis, o outro vê um nove. E não entendem como é que o outro vê um número diferente a partir da mesma realidade, sem tentar perceber a sua perspetiva, dado que estão apostados quase unicamente na defesa, e não na compreensão de como pode um seis ser um nove.
E, isto, não se trata de estar certo ou errado, mas inevitavelmente surgem mal entendidos e, até, inimizades.
Logo, um sentido autocrítico; o simplesmente ser; o colocar-me no lugar do outro, o sair de mim e olhar para as situações como se eu fosse um terceiro, desafetado das minhas opiniões e crenças pessoais, me podem ajudar a uma avaliação realista e justa, objetiva!
Este exercício de auto crítica, relembro, requer um particular sentido de humildade para uma avaliação de descoberta objetiva.
Caso contrário, vou olhar para mim com a ideia preconcebida de me justificar. E até posso pensar com honestidade, que nada encontro de errado em mim, mas será que me consigo avaliar sozinho, objetivamente, precisamente para não cair em falácias de auto desculpabilização?
Além deste exercício de sairmos de nós para avaliar a realidade inter-relacional, pessoal, profissional, os problemas que surgem e como lidar com eles, etc., precisamos também de ter ferramentas que nos ajudem a ser o barómetro da realidade, porque, sem elas, podemos nunca saber se fazemos uma avaliação correta de nós mesmos.
Sem saber gerir as emoções, todo o diagnóstico terá começado pelo telhado. Até por bloqueios afetivos autoimpostos, mesmo sem nos apercebermos deles (o que vai gerar novo problema).
E também há coisas tão simples que nos ajudam a uma boa higiene mental: o saudável, porque catártico, sentido de humor; a doação (através do amor, da amizade, da entreajuda e da partilha); a capacidade de relevar e esperar, porque não podemos ultrapassar o fator Tempo, mas também porque a vida é dinâmica, e também nem tudo depende de nós nem se realiza como planeámos!
Tudo isto, além das técnicas de auto cuidado, [(como dormir bem, telefonar, escrever ou falar com alguém sobre os nossos sentimentos, procurar relações que nos fazem bem, e não as estáticas sem horizonte, ou as que nos cobram demasiada energia, pedirmos ajuda técnica, se for o caso, termos tempo para nós, desde ouvir uma música, ler um livro, contemplar o mar, sair sozinho, mimarmo-nos com o que existe de mais precioso (o Tempo), mas de forma qualitativa, indo ao encontro do que gostamos, e sairmos do modo "estar em todas")], tudo isto é, igualmente, fonte de higiene mental.
É muito vasta a abrangência da saúde mental, e daí este dia que lembra a sua incontornável importância.
Em Portugal, uma em cada quatro pessoas vive com doença mental, e não precisamos de nos lembrar logo de esquizofrenia, transtorno bipolar, borderline e outras! Também o são a ansiedade, depressão, transtorno obsessivo compulsivo, sendo a depressão, ela mesma um transtorno mental, a principal causa de doenças mentais.
No entanto, é importante ressalvar, que o bem estar emocional, também depende de fatores sociais, psicológicos e biológicos.
Uma pessoa que tem um padrão de comportamento ou pensamento, que impacta negativamente na sua vida, poderá necessitar de aconselhamento médico.

É muito importante aprender a viver afetivamente bem connosco mesmos, e sempre que nos recusamos sentir, sempre que não damos ouvidos à emoção, com mecanismos como a racionalização, por ex. estamos a bloquear afetos e aprendizagens e, com isso, a capacidade de nos melhorarmos, de nos conhecermos melhor, de lidar melhor com a frustração, com a dor, as adversidades, com o que pensamos e temos por garantido, de nada valendo a opinião do nosso interlocutor...
Sempre que nos escutamos mais, nos ouvimos mais, o que sentimos e porquê (o que só acontece se desligarmos o modo estritamente racional para podermos aceder às emoções, tal como para chegar ao Outro: nunca chegamos ao Outro pela razão mas pela emoção, e por isso tanto descaminho e vidas disfuncionais -), sempre que nos ouvimos por dentro, seremos sempre mais pessoas, mais humanos, mais nós.
Sem um sentido autocrítico, estamos a entrar no caminho fácil de não nos querermos conhecer e, muito menos, trabalhar, porque requer também humildade na desconstrução diária do que temos como absoluto, para nos voltarmos a construir.
Só assim, conseguimos atualizar as nossas decisões e conhecer outras perspetivas.
De igual modo, se a resiliência é importante, não menos é permitirmo-nos sentir a tristeza, o abatimento, sem forçar o que não sentimos, porque essa artificial invencibilidade emocional e psíquica, pode provocar um agastamento impercetível com custos depressivos a médio e longo prazo.
Sem ferramentas tão simples como algumas das que tenho enunciado, tais como aceder às emoções e tentar perceber porque as sentimos, em vez de as negar; o sentido de autocrítica que requer humildade para a mudança, etc. forjamos a "nossa" realidade, e depois dizemos que é ela que nos engana.
E dizemos que é a realidade que nos engana, precisamente porque no jogo de espelhos onde não nos queremos assumir inerrantes, e só queremos ver a perfeição, está, paradoxalmente estampada, a limitação que recusamos, e que, por falta de caminho interior, não conseguimos ter a capacidade de a perceber.
Dizia Einstein que nunca chegou a nenhuma descoberta pelo mero processo de pensamento racional. O mesmo com o nosso mundo interior.
Podemos ter todos os motivos para nos sentirmos mal, mas é na maneira como lidamos com esse mau estar, na nossa atitude, na nossa higiene mental, que se encontra a verdadeira solução...