13.6.24

SANTO ANTÓNIO ou O AMOR SECRETAMENTE PEDIDO


Instintivamente somos impelidos ao Outro, somos impelidos à comunhão, está inscrito na nossa constituição como seres humanos que só somos com o Outro!

Somos seres relacionais.
É natural que o santo António receba tantos pedidos de Amor.

As Festas dos Santos Populares não são o Teatro Nacional de São Carlos, uma ópera, um concerto de música erudita, uma palestra literária ou um bailado russo.
Podem ser, aqui e ali, um misto de canções populares com uma espécie de música de carnaval after hours, mas são diferentes.

Também não é fado, que é do povo.

É o outro lado do fado, é o lado alegre que o português não tem.
Mas é, também, Partilha.

"O meu bairro é liiiiiindo" não cheira a competição mas a partilha.

As pessoas saem de casa e sentem coletivamente momentos assim.

Porque a noção de pertença e de partilha estão intimamente ligadas.

Convocam do fundo de nós a saudável abertura de um abraço a um desconhecido.

Como um único coração na praça grande que são as ruas e a vida.
É assim que a humanidade se humaniza.
Na partilha descomplexada e natural, sorridente e amiga...

Mas voltemos ao início:

os secretos pedidos de amor, o forte desejo de nos completarmos (desengane-se quem se achar autosuficiente), serão sempre uma contínua torrente.

Isto acontece porque a vida é dinâmica, e porque ninguém se faz nem realiza sozinho!

Uns casam, outros namoram, outros suspiram, outros são traídos, outros ainda não estão prontos, outros acham que têm muitos amigos, outros simplesmente não têm nenhuns, outros gostam de estar sós, outros magoam e são magoados num processo inconsciente de tanto se quererem.


É, aliás, por isso, que devemos estar constantemente vigilantes sobre os nossos pensamentos.
É preciso que nos desconstruamos todos os dias.

Aprender ferramentas que nos coloquem onde devíamos estar.

Mas isso não se consegue sem a humildade necessária em reconhecer que podemos não estar certos.

E, sem reconhecimento, não existe mudança, e vamos cegamente em frente na nossa dogmática (porque não esclarecida sobre nós mesmos) razão.

Há encontros que não se dão, amores mortos à nascença, porque não nos sabemos desconstruir, cortar os gatilhos emocionais do passado que nos levam a ter sempre uma ferida presente.

E, no entanto, sem que o reconheçamos, não existe terapia ou razão que nos valha.


Masoquisticamente, vamos em frente, escudados na satisfação do ego, das nossas falsas certezas. São os outros que estão mal!


É uma das coisas mais difíceis de trabalhar no ser humano, quando somos levados pelas nossas crenças limitadoras, porque nos impede de reconhecer que há algum trabalho a fazer em nós!


Chama-se viés cognitivo, provocado de forma não consciente, pelo cérebro emocional.

Como em tudo, porém, existe um preço.

Um dia, deparamo-nos com um precipício que nos mostrará o deserto que fizemos autoimposto, porque não houve reconhecimento de que, talvez, tivéssemos de mudar de lentes.

E o tempo passa, e fomos nós que criámos os nossos próprios espinhos, o nosso próprio deserto.

E tudo isso é de uma profunda e lamentável desinteligência!

Porque fica uma tóxica solidão.

Não por não nos quererem, mas porque rejeitamos tudo o que nos desinstale de nós mesmos.

Das nossas supostas certezas, deixando que a ferida emocional instalada, contagie e contamine qualquer nova aproximação.
Que tenha um outro olhar.
Um olhar não refém de si mesmo.
E acontece a solidão.

De quem não se realiza afetiva e integralmente como Pessoa, exceto a intervalos avulsos que serão sempre insuficientes para uma verdadeira doação e reciprocidade de entrega.

Resta-nos oferecer gratuitamente o nosso sorriso a quem passa.
Reconhecer e intuir as dores escondidas.

Perceber que nem todas as alegrias são alegres, mas que também nem todo o sofrimento é dramático. Sê-lo-á, porém, quando o autoinfligimos, um processo de manter intacto o nosso padrão de pensamento.

...e com manjericos ou martelinhos, com cartas ou sardinhas assadas, com selfies ou pinotes, há sempre tanto pedido para a felicidade que nós próprios matamos.

E de Santos Populares em Santos Populares, afinal o problema esteve sempre tristemente em nós...